domingo, 1 de maio de 2016

Na Academia das Ciências

Quinta-feira, 28 de Abril de 2016, 15 horas
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O que me trouxe ali foi testemunhar uma cerimónia, importante na vida de alguém que se consagrou ao estudo e à acção. Além do aspecto simbólico, releve-se o contributo substantivo presente nas comunicações: a do elogio histórico a quem, por razões de saúde, deixou de poder dar colaboração e presença assídua na Academia e a da saudação feita ao académico que lhe sucederá na cadeira n.º 25, da classe de Letras.
Tive o privilégio de estar presente num dia importante para Manuel Ferreira Patrício. Por sorte, pois tive muito gosto nisso, o homenageado foi Fernando Castelo-Branco, meu professor de Psicologia na Escola do Magistério Primário de Lisboa, quando fui aluno-mestre nos anos de 1963-1965. Uma vez nos disse o director, na aula, que Fernando Castelo-Branco era o maior arqueólogo português daquele tempo. Essa realidade, a compreensão exacta dela, escapava-nos quase totalmente, empenhados e limitados que estávamos na vivência escolar, no nosso pequeno mundo. Mas, registei a informação, assim, até hoje, sem embargo de alguma traição da memória; se não era o maior, era um dos maiores e nisto já há certeza.
Tenho alguns livros de Fernando Castelo-Branco: Lisboa Seiscentista, Breve História da Olisipografia, Aspectos e Canções da Apanha da Azeitona em Borba e Museus de Lisboa. Folheio o texto da comunicação apresentada ao I Congresso de Etnografia e Folclore resultante da sua permanência no mês de Dezembro de 1946 em Borba, publicado «apenas com ligeiras alterações formais e alguns acréscimos que vão indicados entre [ ]». O interesse vem de ter vivido alguns anos em Estremoz, bem perto de Borba, e ter gosto nas recolhas de poesia popular. O cancioneiro em apêndice á comunicação foi recolhido por Fernando Castelo-Branco e incorpora uma «valiosa colecção de poesias» recolhidas pelo Padre João de Deus, que lhas ofereceu depois de elaborado o estudo.
 Fernando Castelo Branco é um polígrafo, sendo numerosa e variada a sua bibliografia.
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Britaldo Rodrigues — 4.ª Secção  Ciências da Terra e do Espaço
O seu elogio foi feito por Manuel Lemos de Sousa, que começou por fazer o historial da orgânica da Academia e da Classe de Ciências, desde a fundação. O número das cadeiras dos académicos foi aumentando com o decorrer do tempo e também houve rearrumação das formações. Assim, por exemplo, o Professor Joaquim de Carvalho, catedrático de Filosofia da Universidade de Coimbra, sentou-se na mesma cadeira que tem sido ocupada por Britaldo Rodrigues. O percurso de Britaldo Rodrigues como professor, investigador e político é muito denso e tudo poderá ser consultado, após a publicação do texto do elogio histórico em boletim da Academia, ainda com mais pormenor do que o que foi possível dizer no tempo concedido para a comunicação. Acompanhei a carreira de Britaldo Rodrigues apenas nos finais dos anos oitenta, na sua passagem pela Comissão de Reforma do Sistema Educativo, onde chegou a ocupar o lugar de presidente.
Fernando Castelo-Branco — 3.ª Secção – Filosofia, Psicologia e Ciências da Educação
O seu elogio foi feito por Manuel Ferreira Patrício, que referiu os principais trabalhos do homenageado e o seu percurso académico. Fez estágio para professor do ensino liceal no Liceu Normal de Pedro Nunes, tendo aí realizado o Exame de Estado. Foi, depois, professor nos liceus D. João de Castro e Passos Manuel, de Lisboa. Exerceu funções docentes na Escola do Magistério Primário de Lisboa. Foi sócio de várias instituições, além daquela onde nos encontrámos: a Academia de Marinha, a Academia Nacional de Belas Artes, a Sociedade Histórica da Independência de Portugal e a Academia Portuguesa de História. Colaborou com a Sociedade de Geografia, o Instituto de Investigação Científica Tropical e a Câmara Municipal de Lisboa.
Tem vasta obra dispersa, publicada e por publicar.
                                                                            *   
           António Braz Teixeira, com o conhecimento profundo que tem de Manuel Ferreira Patrício, expôs os aspectos principais da já longa actividade do seu confrade, no ensino, publicação de livros, colaboração em revistas, conferências, associações de teor cultural e científico. Fez-lhe votos de saúde para que possa proceder à selecção e reunião dos seus importantes textos filosóficos e antropagógicos, de modo a que sejam publicados: os mais de cem (centena e meia?) de cadernos azuis, conhecidos dos que com ele mais privam.
O presidente da Academia das Ciências e da Classe de Letras, Professor Artur Anselmo, agradece a Manuel Ferreira Patrício o elogio histórico de Fernando Castelo-Branco.
Artur Anselmo confessou quanto deve a Fernando Castelo-Branco, não só como amigo, mas também como leitor. «Meu Deus, porque é que este país não publica os Dispersos de Fernando Castelo-Branco? Venham os Dispersos de Fernando Castelo-Branco! A Academia dispõe-se desde já a apresentar à Fundação Calouste Gulbenkian a proposta de se publicação desta obra.»
            E também falou de Britaldo Rodrigues.                                                                   
*
Disse, acima, que a importância da cerimónia era não só simbólica, o que já é importante, mas substantiva, enriquecedora. Aprendeu-se. Foi útil o encontro de todos quantos ali estivemos, embora de maneiras diferentes. Foram úteis as vidas dos homenageados. Úteis, por terem fundamento, as comunicações. Vão ainda ser úteis à Academia, e à sociedade em geral, os que vão continuar a dar o seu contributo; vão continuar a fazer. Caso contrário, seria vã a sua glória.
Nisi utile est quod facimus stulta est gloria. É vã a glória se for inútil o que fizermos.  (Do sítio na internet da Academia)
 *

Na mesa: Manuel Lemos de Sousa, Carlos Salema (vice-presidente da Academia e presidente da Classe de Ciências), Artur Anselmo, (presidente da Academia e presidente da Classe de Letras), Maria Salomé Pais, (secretária-geral da academia), Soares Martínez, (decano da Classe de Letras)
Manuel Lemos de Sousa faz o elogio histórico de Britaldo Rodrigues; Miguel Telles Antunes saudou Manuel Lemos de Sousa

Manuel Ferreira Patrício faz o elogio histórico de Fernando Castelo-Branco; António Braz Teixeira saudou Manuel Ferreira Patrício


António Braz Teixeira saúda Manuel Ferreira Patrício


Salão Nobre 




Escola Secundária de Passos Manuel, visto de uma janela do Salão Nobre

A chaminé do jornal O SÈCULO, vista da mesma janela

*
Algumas quadras, escolhidas quase aleatoriamente do cancioneiro publicado  em apêndice ao estudo de Fernando Castelo-Branco

O meu peito é uma morada,
vem p'ra ela, meu amor:
de renda não pagas nada,
ainda te fico em favor.
(Pág. 30)
Quem me dera ter a vida
Que a rosinha tem no campo:
Nem eu tinha tanta lida,
nem em ti pensava tanto.
(Pág. 38)
Queria-te escrever uma carta,
mas não tenho papel branco,
nem o tinteiro tem tinta,
nem o nosso amor é tanto.
(Pág. 19)
Minha mãe já me tem dito:
Filho, não sejas maroto,
Desvia-te das mulheres,
Como a camisa do corpo.
(P. 19)

Da pena do pavão,
do sangue da cotovia,
foi escrever uma carta,
o meu amor de algum dia...
(Pág. 31)
Água de ladeira acima,
sem a levarem não vai.
Correr atrás de quem foge,
não vão filhas do meu pai.
(Pág. 20)
Senhora da Boa Nova,
tens a cruz numa ladeira,
a igreja numa cova,
lá mais abaixo a ribeira
(Pág. 48)
Subi ao céu por uma linha,
Desci por um fio lilás:
Eu já fui ao céu por ti,
Tu por mim não és capaz.
(P. 40)

*
Academia das Ciências, na wikipédia, página visitada em 01-05-2016.
Academia das Ciências, página oficial da Academia, visitada em 01-05-2016.
Academia das Ciências, sócios efectivos da Classe de Letras, página visitada em 01-05-2016, actualizada, em relação à anterior.

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