segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

«Vous êtes un bavard sympathique»

Do jornal Público:


Morreu a hispanista Annie Salomon, mulher de Eduardo Lourenço e tradutora da sua obra

Annie Salomon teve um papel determinante na divulgação da obra de   Eduardo Lourenço em França.
01/12/2013 - 18:08
(actualizado às 21:54)
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Morreu este domingo à tarde em Lisboa, aos 85 anos, Annie Salomon de Faria, a mulher de Eduardo Lourenço. Tradutora dos ensaios publicados em francês pelo autor de O Labirinto da Saudade, como Montaigne ou la Vie Écrite ou L’Europe Introuvable, entre muitos outros, teve um papel determinante na divulgação da obra de Eduardo Lourenço em França.
Nascida em Côte du Nord, na Bretanha francesa, no dia 11 de Agosto de 1928, fez os estudos primários em Rennes, licenciou-se na Faculdade de Bordéus em Línguas Hispânicas e aí passou o concurso de agregação em 1955.

No ano anterior casara-se com Eduardo Lourenço e, acompanhando o percurso profissional do marido, foi professora nos Liceus de Montpellier e Grenoble. Em 1964 foi convidada para assistente da Faculdade de Letras de Nice, onde veio a terminar a sua carreira académica como mâitre de conférences, tendo-se jubilado em 1988.

Irmã de um hispanista especializado em Lope de Vega, também ela consagrou a sua actividade académica à literatura latino-americana, em particular à mexicana, com o estudo da obra do pioneiro autor picaresco Fernandez de Lizardi.

Annie Salomon e Eduardo Lourenço levavam já 20 anos de casados e ensinavam há quase uma década em Nice, quando, em 1974, compraram casa nos arredores, em Vence. Moraram nesta vivenda, em cujo jardim o próprio ensaísta plantou um renque de ciprestes, até há poucos anos, mas acabaram por ter de se mudar, por razões de ordem prática, para uma casa mais pequena e menos isolada. O casal decidiu então doar uma parte considerável da sua vasta biblioteca à Biblioteca Municipal Eduardo Lourenço, na Guarda.

Pouquíssimo dada a intervenções públicas, Annie Salomon abriu uma excepção para participar na inauguração desta biblioteca, em Novembro de 2008. Observando que a sua formação universitária parecia destiná-la a dedicar-se ao mundo hispânico, explicou então que essa era “uma previsão demasiado lógica”, que “ignorava o papel do destino que levou um jovem português a cruzar o [seu] caminho na Universidade de Bordéus”.

Esse Eduardo Lourenço acabado de aterrar em Bordéus no final dos anos 40 descreveu-o Annie a quem a ouviu na Guarda, 60 anos mais tarde, como um “filósofo” que “falava mal francês”, mas que nem por isso deixava de “intervir com veemência nos debates de vários círculos culturais da cidade”. E que “era fascinante”. A tal ponto que um dia, contou, atreveu-se a dizer-lhe: “Vous êtes un bavard sympathique.” E concluiu: “Uma frase fatal, que selou o meu destino: casei-me com Eduardo Lourenço em 1954.”

E à medida que ia descobrindo através do marido a cultura portuguesa e, mais tarde, a brasileira, tornou-se também a sua interlocutora natural. “Chegou a ser mesmo um verdadeiro partage, em momentos privilegiados de cumplicidade e identidade”, recordou Annie, acrescentando que “sentia isso particularmente quando traduzia os seus livros”.

Terça-feira será realizada uma missa de corpo presente às 15h30 na Igreja de São Sebastião da Pedreira, em Lisboa. A esta altura, ainda não há informação sobre o local onde se irá realizar o funeral.
Pode ver-se aqui a notícia como saiu no Público on line.

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