terça-feira, 5 de agosto de 2014

Bibelô

Um homem vê a sua casa deserta. A mulher está a viver noutra, por razões familiares ou profissionais. Vê-se que lhe faz falta a presença da companheira. No caminho para o café, pensei: faz-lhe falta o bibelô (escrevo, assim, por patriotismo ou portuguesismo à Fernando Pessoa, mas custa-me neste caso largar o francês). Uma mulher numa casa é, também, um bibelô, é os bibelôs todos. Que graça têm as mesas e cómodas sem bibelôs?
Ia a caminho do café e fui-me lembrando. «Bibelot». Comecei por lembrar a palavra na grafia francesa. Agora, é portuguesíssima. Que outra pode ocupar o seu lugar? Com outras palavras, para tentar definir o mesmo, as cores mudam, a conotação é diversa, o lume espiritual, a afectividade, a sugestão...
Este texto pode ser reescrito. Começa, assim: «Uma mulher vê a sua casa deserta. O homem está a viver noutra, por razões familiares ou profissionais.» E o resto.
Troquei impressões sobre isto com alguém. E aparece na conversa a palavra «traquitana» (conheço-a como «tranguitana»), introduzida pelo meu confrade. Não sei se queria dar um sinónimo de bibelô. Creio que não. Não ocupa o espectro todo de bibelô. Tem uma coisa em comum. É portuguesíssima.
Nota: O dicionário regista «tranquitana» e a variante «traquitana». Gil Vicente utiliza a palavra, na Barca do Inferno.

2 comentários:

  1. Realmente, pensando bem para a palavra "bibelô" ou "bibelot", não temos outra que a possa substituir e que seja de facto bem portuguesa...!!!
    Então e que fazer? Também me interrogo muitas vezes sobre este assunto, mas parece-me que não existe mesmo...!!!
    Quanto às "traquitanas" (como eu sempre ouvi dizer), ou "tranguitanas" como refere, são coisas bem diferentes dos bibelôs....!!!
    Mas isto é uma "mania" que nos vem desde sempre.... (aportuguesar palavras que nada têm a ver com a nossa língua.....)
    Outro exemplo é o "Chofer" e o "Chauffer", bem mas aqui temos o "motorista" que substitui o chofer, na perfeição...
    E tantas outras....!!!!
    Se começarmos a falar disto nunca mais daqui saímos.....
    Mas que dá que pensar, lá isso é verdade....!!!

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    1. Eu tento sempre dizer à portuguesa. Os espanhóis vestem as palavras estrangeiras com a pele do castelhano, espanholizam-nas. Na minha luta, não fundamentalista, longe disso, chego a dizer «sítio», em vez de «site», mas nem sempre tenho a coragem ou lata, para ser coerente. Quanto às tranguitanas, se calhar ouvi mal, trocando o «g» pelo «q», mas a evolução das línguas também se deve, talvez, ao mau ouvido de quem ouve...

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