Achei uma delícia o artigo de Xavier Sardà*, no primeiro jornal em língua catalã que me veio parar às mãos. Um desejo antigo, poder ter acesso a esta — e tão próxima de nós — língua de cultura. Estas são as minhas primícias.
A maneira como são usados os esquecimentos, o direito de não dizer nada em alguma fase do processo e de um modo geral a lentidão da nossa justiça, mina aberta a prazos, expedientes e incidentes, aguçou-me o apetite para este manjar.
Foi também oportunidade para conhecer o célebre questionário de Proust**. Este questionário vem na linha dos que havia em Inglaterra no séc. XIX, as Confessions. O entretém remonta, ali, aos anos 1860. Estou em crer que os questionários que alunos e alunas do Liceu de Évora preenchiam há cinquenta anos, são uma continuação livre e simplificada, adaptada ao gosto das meninas e meninos de então. As perguntas eram escritas no próprio caderno de uma disciplina e a pessoa a quem eram apresentadas respondia. Não participei, mas tive conhecimento directo de um caso e isto aumenta o meu interesse por este assunto.
O jogo de Xavier Sardà resultou em cheio.
*Ver, abaixo, a seguir à tradução.
**ver, no fim, duas ligações à internet.
A maneira como são usados os esquecimentos, o direito de não dizer nada em alguma fase do processo e de um modo geral a lentidão da nossa justiça, mina aberta a prazos, expedientes e incidentes, aguçou-me o apetite para este manjar.
Foi também oportunidade para conhecer o célebre questionário de Proust**. Este questionário vem na linha dos que havia em Inglaterra no séc. XIX, as Confessions. O entretém remonta, ali, aos anos 1860. Estou em crer que os questionários que alunos e alunas do Liceu de Évora preenchiam há cinquenta anos, são uma continuação livre e simplificada, adaptada ao gosto das meninas e meninos de então. As perguntas eram escritas no próprio caderno de uma disciplina e a pessoa a quem eram apresentadas respondia. Não participei, mas tive conhecimento directo de um caso e isto aumenta o meu interesse por este assunto.
O jogo de Xavier Sardà resultou em cheio.
*Ver, abaixo, a seguir à tradução.
*
PROUST E A INFANTA
Misturar
fragmentos de realidade sem ligação está na base de imaginar mundos diferentes.
Como seriam as respostas da infanta Cristina
num outro contexto? Imaginemos as mesmas respostas a perguntas diferentes:
a filha do Rei respondendo ao célebre questionário
Proust:
— Qual é o seu maior receio?
—
Não me lembro bem porque foi há muitos anos.
—
O principal traço do seu carácter?
—
Não me lembro bem porque já vai fazer muitos anos e não me lembro.
—Qual
é a qualidade que prefere nos homens?
—
Sei que o meu marido trabalhava e prestava os seus serviços à Octagon, não
recordo nada de Namasté.
—
Qual o seu principal defeito?
—
Não sei, desconheço.
—
Que aprecia mais nos seus amigos?
—
Não sei, senhoria, desconheço.
—Se
não fosse você, quem gostaria de ser?
—
Não sei.
—
Quais são os seus autores favoritos em prosa?
—
Soa-me a algo, mas não sei qual a relação.
—
Quais são os seus autores de ficção?
—
Eu dou-lhe força para empreender um projecto novo, depois da sua formação na
Esade e da sua experiência na Octagon, para se lançar a outros projectos de
âmbito desportivo, porque é a bagagem que tem.
—
Qual é o facto histórico mais deplorável?
— O nome escolhê-lo-íamos entre ambos, mas
agora não me recordo entre que nomes vamos escolher. Ou o vai escolher ele ou o
vou escolher eu.
—
Que feito militar admira mais?
—
O meu marido pede-o e por confiança nele, vai-me parecer bem e vou aceitá-lo.
—
Qual é o seu actual estado de espírito?
—
Se está aqui é que o haveria de receber, mas não me lembro.
—
Qual é a falta que lhe inspira mais indulgência?
—
Só me recordo de ter ido ao acto de constituição, mas creio que não vai ser nem
uma junta.
—
Onde lhe agradaria viver?
—
Não sei.
—
Que pássaro prefere?
—
Não me lembro.
— Os seus compositores favoritos?
— Os seus compositores favoritos?
— Soa-me
a algo, mas não sei qual a relação.
—
Qual é o seu lema?
—
Conheço-o como jogador de andebol.
—
Que dom da natureza lhe agradaria possuir?
—
Assessor fiscal do meu marido.
Imaginemos
agora uma declaração da infanta Cristina perante o juiz Castro: «Sou infanta de Espanha e filha
do Rei. Tanto pela minha condição de membro da Casa Real, mas também como mulher
e a título pessoal, quero deixar claro que tenho a obrigação e desejo ter a
mesma sorte jurídica que o meu marido. Os meus advogados falaram de amor e
confiança, mas vejo que não sabem o que significam estas palavras no seu real
significado. Não me degradem como mulher à ignorância ou ao olvido. Sim,
respeito e estimo o meu marido e por esta razão nunca o trairei.»
el Periódico de Catalunya PER A GENT COMPROMESA, 23 DE FEBRER DEL 2014
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