2 de Abril de 2015, Quinta-Feira Santa
Viana do Alentejo
Chegámos mais ou menos à hora do almoço. Almoçámos no
café-restaurante Rotunda, no largo do chafariz, com os edifícios da
Misericórdia, em frente. O nome do largo: Rossio das Hortas. É dali que parte a
Rua António José de Almeida.
Almoço – sopa de feijão com abóbora muganga, meia dose de iscas
com batatas cozidas, para os dois; meia dose de filetes de pescada, para os
dois; sobremesa (manga) e café. No final, licor de poejo, oferta da casa, bom
para limpar – diz o responsável que nos serviu, com simpatia natural. No café,
têm pastel de feijão e folar (padinha).
Depois da visita
ao castelo, descemos calmamente a Rua Cândido de Oliveira, passámos pela
Praça da República e dirigimo-nos ao santuário de Nossa Senhora d'Aires.
À volta da igreja, no raso do campo, predomina o arroxeado dos
lírios silvestres.
A entrada na nave foi muito breve, sem entrar no altar-mor nem ver
os ex-votos deste santuário de Nossa Senhora d’Aires, a uns 2000 metros da vila.
A Senhora d’Aires
De ao pé de Viana
Tem o seu altar
Tem o seu altar
Feito à romana
Na interpretação do Coro Sinfónico Lisboa Cantat, ouçamos a beleza e como primazia das vozes
femininas e a limpidez, precisa, em tom suave, mas audível das vozes
masculinas. Perfeita harmonia.
Repetindo as audições:
Repetindo as audições:
A Senhora d'Aires
De ao pé de Viana
Tem o seu altar
Feito
à romana
A Senhora d'Aires
De ao pé de Viana
Tem o seu altar
Feito
à romana
Tem o seu altar
Feito à romana
A Senhora d’Aires
De ao pé de Viana
Tem o seu altar
Feito à romana
A Senhora d’Aires
De ao pé de Viana
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Duas vozes femininas
Todos (mal se percebe os baixos)
Duas vozes masculinas
Todos (melhor se percebe os baixos. Na
sílaba final do quarto verso, «na», no remate da canção, os baixos afirmam-se
um pouco mais).
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O que disse supõe um ouvido um pouco desatento.
Sendo «todo ouvidos», percebe-se e isola-se todas as vozes. Todavia, a
impressão inicial, talvez por lhes caber a entrada, digo, mas não estou
convencido disso, a voz feminina, em geral, e, especialmente, a soprano, parece ser
a guia, a que mais nos leva e enleva. Ao cabo de tudo, todos cantam e contam. É
a perfeita harmonia.
(Clique
na pauta, para melhor definição.)
Não deixe de ver mais
duas versões de A Senhora d'Aires, especialmente o texto e o cante do Grupo
Coral Os Almocreves, da Amieira, Portel. De uma religiosidade sincera, límpida,
respeito pela natureza (e sentido da vida, da mocidade), como nos tempos de fé.
Túlio Espanca, aqui? A evocação da mãe é comovente. Já há a saudade futura da
mãe que se vai perder. É pressentida a saudade, pela falta. A Virgem como toma
o lugar. As duas mães confundem-se. Estão as duas no céu, estiveram as duas na
terra. Continuam na terra, confundem-se.
Sente-se o sagrado da
natureza, nesta interpretação. De noite, no Alentejo, vê-se o céu estrelado,
com nitidez. Recolhimento da noite. Os pais olham a lua e contam aos filhos a
lenda do homem que foi castigado e caminha, carregando um fardo. De dia, o sol.
E a mocidade chega e canta, dissipando a tristeza da saudade. É em Setembro.
Mês que olha para trás, o Verão, a Primavera que já foi, e para a frente, o
Outono já aí, o Inverno que lá vem... E a mocidade traz um céu aberto, a Virgem,
até ali metida num deserto, parece um céu aberto.
A rapariga diz: «Vim
solteira, vou casada, foi milagre da Santinha.» O rapaz diz: «Vim solteiro, vou
casado. Foi milagre da Santinha. Foi milagre da Santinha, foi milagre do
Senhor. (E) ó Virgem, Senhora d'Aires, Tão linda..., vai no seu andor.»
O
tempo de fé volta nestes minutos que dura o cante. «Cante», para se perceber
bem que ali está esta maneira de cantar, na pronúncia, na alma alentejana. Os
tempos de hoje talvez não consigam produzir a maravilha do cante alentejano.
Resultou de uma vivência, dura sem dúvida, que hoje não existe. Por uns
minutos, no entanto, estes homens e mulheres pegam no fogo puro da tradição,
vestem-se à antiga, com fatos que foram muito verdade, aprenderam a cantar com
medida, ritmo; as palavras são pronunciadas com cuidado e respeito, num esforço
de as dizer bem, de as tratar como merecem. As nossas palavras.
Veja Os Almocreves, VÍDEO E TEXTO, e a letra e a transcrição musical da versão de A NOSSA SENHORA D'AIRES, de A. Marvão, Vidigueira / Beja, 1920 - 1942.
Veja Os Almocreves, VÍDEO E TEXTO, e a letra e a transcrição musical da versão de A NOSSA SENHORA D'AIRES, de A. Marvão, Vidigueira / Beja, 1920 - 1942.
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Casa da primeira horta
Olhamos à direita, começamos a ver...
... ainda não sabemos o nome da ermida. Dialoga com o santuário de N.ª Sr.ª de Aires
Ermida do Senhor Jesus do Cruzeiro
É dos alvores do reinado de D. João V. «Esteve, até c.ª de 1950, envolvida por muretes do passal e pequena habitação rústica do presbítero, na face do ocidente, a qual desmoronou ulteriormente mas continua terreno do património da paróquia de Viana.» (Túlio Espanca, no Inventário Artístico de Portugal, Distrito de Évora, I Volume, IX, academia Nacional de Belas Artes, Lisboa,1978.) Valiosos a descrição e mais elementos fornecidos por T. E., na obra referida, p. 456, cols. 1 e 2. Ver sobre o processo de classificação e mais, o SIPA; informações e as imagens que documentam o estado actual do monumento em ruinarte, com a devida vénia. ermida emViana do Alentejo
A Alameda dos Romeiros veste-se de lírios roxos
«[...] esteve nos antigos tempos de fé, ensombrada por seis ruas de choupos em linha» (T. E., na obra citada, p. 455, col.1.)
Santuário de Nossa Senhora d'Aires
Começou a ser construído no ano de 1753, precedendo a demolição, iniciada em 29 de Abril de 1743, do anterior templete quinhentista, por se ter tornado de modestas dimensões para o crescente número de visitantes. Bênção e inauguração solene da igreja, em 15 de Março de 1760, mas as obras só vieram a ficar concluídas em 1804, tendo na segunda sagração, dia 13 de Maio, estado presente o grande arcebispo de Évora, D. Frei Manuel do Cenáculo Vilas Boas.
No adro, em frente do templo, o obelisco da sagração de 1804
Lírio silvestre
Que veio este lírio fazer à igreja?
A brisa exterior não permitia uma completa imobilidade; foi precisa a serenidade do templo, para tentar melhor fotografia
A nave e o altar-mor
O santuário
Está dentro de baldaquino de talha dourada e tem quatro altares. «Em delicada maquineta envidraçada», a imagem de N.ª Sr.ª de Aires (Piedade) «peça gótica de pedra de ançã, policromada e de características de fins do séc. XV [...] mede de alt. 35 cm». (T. E., na obra citada, p. 453, col.2.)
Electa ut sol Speculum sine macula Pulchra ut luna
Eleita como o Sol Espelho sem
mácula Bela como a Lua
(Editado, em 28-04-2015)
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