É preciso tornarmo-nos melhores, mais solidários
Não gosto, preferia pôr estes artigos de opinião num endereço electónico, com o conteúdo acessível por um clic, mas nem sempre é possível. O que vai a seguir, de LVT, merece reflexão. De outro teor é a opinião de Vasco Pulido Valente, hoje, no Público, que vale como um retrato e pode parecer colidir com «Quantos funcionários públicos devem ser despedidos?», mas não. Temos é de procurar ir mudando o retrato. Precisamos de nos tornar melhores e mais solidários, cada pessoa e as comunidades, no seu todo. Ligarmo-nos mais à tradição de reforma das mentalidades (e atitudes). Exigir os melhores, para dirigir e não escolher os piores.
Como gostei de ouvir a recente entrevista de Jacques Delors!
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Quantos funcionários
públicos devem ser
despedidos?
Opinião
Luís Valadares Tavares
1 A vida nacional tem vindo a sofrer com
a incerteza exógena associada à recessão europeia e com a instabilidade de
decisões anunciadas pelo nosso Governo e orientadas para reduzir o desequilíbrio
orçamental.
Neste segundo caso assumem especial
actualidade diversas medidas anunciadas para a função pública incidindo sobre
rescisões amigáveis, requalificações e despedimentos, pelo que é oportuno
reflectir sobre os desafios e as prioridades a assumir para a nossa função
pública.
2 Gostaria de esclarecer que os nossos
trabalhadores com remunerações suportadas total ou parcialmente por recursos
públicos se distribuem por cinco subsistemas com características e
enquadramentos legais muito diversos: a Administração Directa, os Serviços e
Fundos Autónomos, as Administrações Regionais, a Administração Local e as
Empresas Públicas. Todavia, a atenção do Governo parecer centrar-se apenas nos
dois primeiros subsistemas que se poderão designar por Administração Central
(talvez por desconhecimento ou menor influência relativamente aos restantes, em
especial as empresas públicas) e que correspondem a cerca de 430 mil
trabalhadores. O peso das remunerações públicas é próximo de 10% do PIB,
inferior à média comunitária, e tem sido a função pública, a par dos
pensionistas, que mais tem suportado o custo dos desequilíbrios nacionais: de
2005 a 2012, a percentagem do PIB atribuída à remuneração pública apenas se
reduziu em menos de 1% na UE, enquanto em Portugal se reduziu em 29%! Ou seja,
a percentagem do nosso PIB afecta ao trabalho dos funcionários públicos quase
se reduziu em 1/3 no prazo de sete anos.
3 Globalmente, a nossa Administração
Pública (AP) tem vindo a mostrar responder muito positivamente a grandes
desafios de mudança desde que se prestigie o seu papel e se prossigam rotas
estáveis, tal como aconteceu desde 2003, com o sistema de avaliação de
desempenho (SIADAP) agora elogiado no relatório da OCDE (1), ou com a
Administração Electrónica e a Contratação Electrónica, casos em que Portugal é
pioneiro e continua nos primeiros lugares do ranking europeu. Os principais
problemas diagnosticados continuam a situar-se na extensão, na repetição e na
diversidade de procedimentos, os quais não têm vindo a ser simplificados, mas
antes complexificados, e na ausência de instrumentos comuns para a sua gestão,
continuando a aguardar-se por ferramentas sempre anunciadas por agências
públicas com elevados orçamentos e para tal criadas mas ainda não
disponibilizadas.
4 No que respeita às pessoas, é essencial
“não contar cabeças”, mas antes ter em conta os subsistemas referidos, os
escalões etários e os seus níveis de desempenho e competência. Ora, a
Administração Central tem cerca de 78.000 trabalhadores com 55 ou mais anos,
cerca de 36.000 com não mais do que o 2.º ciclo do Ensino Básico, e uma
reduzidíssima percentagem de doutorados (como é evidente não se inclui aqui o
Ensino Superior Publico).
Compreende-se, assim, que uma política
estável, inteligente e sustentável para melhorar a Administração Publica,
condição essencial para a prossecução de qualquer política de consolidação
orçamental ou desenvolvimento, implica assumir cinco prioridades:
a) Melhorar o sistema de gestão e
avaliação e aumentar os incentivos à excelência;
b) Estabelecer as metas de competências
necessárias e identificar as redundâncias do pessoal não especializado e as principais
carências actuais;
c) Oferecer programas de formação
especializados, cabendo aos responsáveis pela AP a especificação dos objectivos
e dos níveis dos programas de formação necessários;
d) Organizar percursos de formação e
mobilidade articulando B e C;
e) Oferecer propostas de rescisão amigável
por mútuo acordo a todos aqueles que não correspondam às carências reais e que
não optem pela requalificação.
5 Infelizmente, a evolução nos últimos
dois anos tem correspondido a um retrocesso relativamente às prioridades
definidas, pelo que o Governo está agora em piores condições do que em 2011
para as assumir: desapareceram os incentivos à excelência no SIADAP (promoção
mais rápida), desvalorizaram-se as competências especializadas, esvaneceu-se a
escola de prestígio nacional e internacional que podia prosseguir a concepção e
a prototipagem dos programas de formação (INA) e confunde-se mobilidade com
ameaças de despedimento. Chegados, pois, a este momento, que fazer?
Será a via do despedimento de 30.000
funcionários recomendável? A resposta está nas propostas do relatório da OCDE
encomendado pelo Governo, apesar de não ter colhido expressões de louvor tão
emocionado como o do já esquecido relatório do FMI:
a) Melhorar o sistema de gestão de
recursos humanos e o elogiado sistema SIADAP, incentivar a excelência e
disponibilizar os prometidos instrumentos de gestão;
b) Iniciar estratégias de formação e
mobilidade;
c) Oferecer um programa de rescisões
amigáveis;
d) Não estabelecer qualquer programa de
despedimentos, pois, tal como se sugere no relatório, qualquer large scale downsizing, além
de evitável, atendendo às previsíveis reduções por rescisão amigável, irá gerar
perturbações e paralisações das administrações, muito graves para todos os
cidadãos e para todos os governantes, prejudicando o défice em vez de o reduzir
e bloqueando drasticamente qualquer início de processo de crescimento.
Esta política, além de sensata e eficaz,
colherá por certo o consenso de parceiros sociais e do principal partido da
oposição, para além de melhorar a coesão na coligação que apoia o Governo, pelo
que também melhorará o clima político nacional neste Verão que se anuncia frio
e chuvoso.
( “Portugal makes greater use of performance assessment
in Human Resources Management decisions in its central government than any
other OCDE Member country. This has been achieved through the introduction of
an integrated system of performance assessment in the public administration
(SIADAP) which is a major asset in its modernization strategy” (página 62, Portugal: Reforming the State to
promote Growth, OCDE, Maio de 2013).
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Professor catedrático
emérito
do IST, ex-presidente do INA ,
Presidente da
APMEP