O Público publica um artigo de Luís Queirós em homenagem a Sophia: Panteão Nacional abre esta quarta-feira as portas à grandeza poética e cívica de Sophia.
Hoje, os restos mortais de Sophia foram trasladados para o Panteão Nacional.
Musa
Musa ensina-me o
canto
Venerável e
antigo
O canto para
todos
Por todos
entendido
Musa ensina-me o
canto
O justo irmão
das coisas
Incendiador da
noite
E na tarde
secreto
Musa ensina-me o
canto
Em que eu mesma
regresso
Sem demora e sem
pressa
Tornada planta
ou pedra
Ou tornada parede
Da casa
primitiva
Ou tornada o
murmúrio
Do mar que a
cercava
(Eu me lembro do
chão
De madeira
lavada
E do seu perfume
Que me
atravessava)
Musa ensina-me o
canto
Onde o mar
respira
Coberto de
brilhos
Musa ensina-me o
canto
Da janela
quadrada
E do quarto
branco
Que eu possa
dizer como
A tarde ali
tocava
Na mesa e na
porta
No espelho e no
copo
E como os
rodeava
Pois o tempo me
corta
O tempo me
divide
O tempo me atravessa
E me separa viva
Do chão e da
parede
Da casa
primitiva
Musa ensina-me o
canto
Venerável e
antigo
Para prender o
brilho
Dessa manhã
polida
Que poisava na
duna
Docemente os
seus dedos
E caiava as
paredes
Da casa limpa e
branca
Musa ensina-me o
canto
Que me corta a
garganta
(Em Antena 2, A
Vida Breve, 01-07-2014.)
Ariana
em Naxos
Tu Teseu que abandonadas amadas
Junto de um mar inteiramente azul
Invocavam deixadas
No deserto fulgor de Junho e Sul
Junto de um mar azul de rochas negras
Porém Dionysos sacudiu
Seus cabelos azuis sobre os rochedos
Dionysos pantera surgiu
E pelo Deus tocado renasceu
Todo o fulgor de antigas primaveras
Onde serei ou fui por fim ser eu
Em ti que dilaceras
Junto de um mar inteiramente azul
Invocavam deixadas
No deserto fulgor de Junho e Sul
Junto de um mar azul de rochas negras
Porém Dionysos sacudiu
Seus cabelos azuis sobre os rochedos
Dionysos pantera surgiu
E pelo Deus tocado renasceu
Todo o fulgor de antigas primaveras
Onde serei ou fui por fim ser eu
Em ti que dilaceras
Os deuses
Nasceram, como um fruto, da paisagem.
A brisa dos jardins, a luz do mar,
O branco das espumas e o luar
Extasiados estão na sua imagem.
(Em A Vida Breve, 02-07-2014.)
Uma traladação merecida.....
ResponderEliminarSempre admirei a Sophia de Mello Bryner Andersen e gosto muito dos seus poemas...
Este comentário foi removido pelo autor.
EliminarEu tenho uma relação ainda um bocado ambivalente. Conheço dois ou três contos e talvez mais nada. No dia do seu funeral, quis estar alguns momentos na igreja da Graça, em Lisboa, porque achei que era uma grande poetisa nossa, por acreditar na opinião geral, praticamente unânime. Em 1969, fui a uma sessão cultural, no Técnico, em que ela interveio. Estava na mesa e os estudantes, na assistência. Disse algumas palavras sobre o ser. Gostei. Fui com dois amigos e a minha irmã. Foi uma sessão muito agradável, que «descambou» para a boa disposição, com a assistência a cantar o Baleizão adaptado: «queira o Marcelo ou não queira»... Há uma relação afectiva que vem desde então. (Removi o comentário anterior, porque foi a maneira de emendar a data que estava -- 1869.)
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