As vinhetas da capa
Tem
a sua graça comparar as vinhetas das capas da Távola Redonda. Mas, antes de mais, alguma coisa sobre esta
revista. Criada e dirigida por David Mourão-Ferreira, António Manuel Couto
Viana e… — o melhor é apresentar a ficha técnica, na página 2 do fascículo 1 —,
no
pós-guerra, pretendia «um lugar para a poesia». A seguir a 45, parecia só haver
lugar para uma poesia mais empenhada, interventiva, menos intimista. A
fidelidade ao encontro perante as coisas, a vida, o mistério inicial, depois
desenvolvido com equilíbrio pelo poeta, é o que propõem no primeiro fascículo
ou folha Alberto de Lacerda e David Mourão-Ferreira (o Davífen, das crónicas de
Artur Portela Filho, no Jornal Novo).
Temos uma conjugação de pessoas com qualidades diversas. No fascículo XX, em
artigo não assinado (D. M.-Ferreira) sugere-se a união de todas as publicações
de poesia numa só, o que não veio a conseguir-se.
«TÁVOLA
REDONDA» OU DA (IM)POSSÍVEL HARMONIA
(Título do texto introdutório à
edição fac-similada da T. R.,de João Bigotte Chorão)
Perguntar-se-á:
as épocas não são outras, as preocupações diferentes? Sem dúvida, a poesia
neste Janeiro de 1950 é com certeza diferente da poesia de 1930 ou 1940. Mas
para explicitar essa mudança, para revelar é este um dos papéis da crítica) uma
provável modificação nos processos e nos temas não é preciso negar a autonomia
da arte, da poesia. Esse o grande erro, esse o nosso protesto. O seu lugar é
único, insubstituível, in-comparável, embora em relação com a vida inteira.
Cada poeta arrasta consigo, como um facto se encadeia noutros factos, todo um
universo. (Alberto de
Lacerda, «Um lugar para a poesia», na p. 2, fascículo 1]
Lirismo,
desenvolvimento de uma exclamação: atitude de quem se espanta, se admira ou
repara — perante, ou em uma — qualquer circunstância, e tende logo a isolá-la, torná-la
independente e memorável. É uma atitude feita de momentos que se tornam
excepcionais; mas tal excepcionalidade,
como é involuntária, não deve transformar-se, para o Poeta, nem em motivo de
opróbrio nem de orgulho; muito simplesmente, urge não esquecê-la, na discussão
do fenómeno lírico. Outro aspecto, necessário também de se tomar em linha de
conta, é o da referida involuntariedade
em que o momento se torna excepcional, exigindo um ulterior desenvolvimento. O
que caracteriza o lirismo não é, portanto, a natureza do momento ou da circunstância, a natureza da emoção ou do motivo. O que o caracteriza é o aspecto involuntário, em que momentos,
circunstâncias, emoções e motivos se apresentam ao Poeta, o aspecto de excepcionais que eles adquirem e, de
maneira decisiva, o processo como
eles ulteriormente se desenvolvem. (David
Mourão-Ferreira, «Lirismo – ou haverá outro caminho?», na p. 8, fascículo 1)
Em
Janeiro de 1950, quando apareceu o primeiro fascículo de Távola Redonda, não existia em Portugal nenhuma publicação de Poesia.
[…] Pouco a pouco, começaram, depois, a surgir novas folhas de Poesia […]. De
qualquer modo, para o público de poesia com que podemos contar, são elas
excessivas – e o certo é que a existência de quase todas é tão precária que
emudecem (extinguindo-se? Interrompendo-se?) ao fim de dois ou três números.
Por isso, daqui lançamos o alvitre de um Encontro […]. E[…] talvez que desse
Encontro viesse a surgir uma Revista de
Poesia Portuguesa. – uma Revista única, onde cada grupo dos já existentes e
dos que viessem a formar-se disporia de um número certo de páginas – para lá
publicar o que muito bem entendesse («Sugestão», pp.
8 e 6, não assinado, de D- M.-Ferreira)
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